terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Eu não sou o cara mais difícil do mundo de se agradar no cinema, mas tô convencido. - Terça no Cinema #1

Vá Assistir O Destino de Júpiter, Mesmo Que Seja Besta (Como De Fato É)





Todo mundo sabe exatamente o que acontece em O Destino de Júpiter, mesmo sem ter visto nenhum trailer. Escolha um clichê, qualquer um, e ele vai estar lá. Temos a heroína com uma vida de m*rda, mas que é destinada à grandeza; o resgate no último segundo; o casal de protagonistas tão opostos que são mais parecidos com o cachorro [Ba-dum tss!]. Nada menos que três elementos de história chupados de Matrix, que alavancou as carreiras de Andy e Lana Wachowski. O roteiro não flui direito, a edição é esquisita, as atuações mais esquisitas ainda e, para coroar, faltou foco.

Agora cale a boca e vá comprar um ingresso.

Vá comprar porque O Destino de Júpiter, apesar de tudo que eu disse até agora, é um filme espacial enorme e muito bonito - do tipo que quase nunca se vê. Porque Mila Kunis (a tão falada Júpiter) é cheia de charme. Porque Channing Tatum (interpretando Caine Wise, um nome que consegue a façanha de ser mais ridículo que Júpiter) é um cara meio-cachorro que parece ter alergia a camisas. Porque o filme tem batalhas espaciais espetaculosas. Porque temos a chance de ver uma superprodução de verão em fevereiro [só lembrando, fevereiro é final de inverno nos States]. Porque é a maior diversão que a gente vai ter até a estréia de Vingadores: Era de Ultron em maio.

Vá comprar porque a habilidade dos Wachowskis de criar mundos é indiscutível. O mundo de Júpiter é uma mistura da Chicago dos dias de hoje com cidades steampunk douradas em galáxias distantes e naves que parecem ter saído da imaginação de uma criança de 12 anos. O filme é sobre a pseudo-reencarnação da matriarca de uma dinastia que se apaixona por um meio-cachorro que anda de patins espaciais? É. MAS O VISUAL É F*DA. (Até o escritório do Terry Gilliam onde Júpiter faz a papelada para conseguir o direito de nascença dela.)

Vá comprar por causa do Eddie Redmayne. Tirando pessoas superfãs de Les Misérables, quase ninguém o conhecia antes de ele ser Stephen Hawking em A Teoria de Tudo. Foi uma performance inacreditável totalmente pautada por reserva e dignidade que lhe rendeu um Globo de Ouro e uma indicação ao Oscar. Mas, se você quiser ver ele baixar a pomba-gira baiana rotatória falando como se o Darth Vader estivesse apertando a garganta dele, é aqui mesmo. Quando falamos com Redmayne sobre o filme, ele disse que Lana Wachowski sempre o instruía a "encarnar um contador." Sei lá quem é o contador da Lana, mas nós queremos Balem Abrasax fazendo nossos IRs. Se você quiser uma boa restituição, é com ele.

Vá comprar porque o filme é uma história original (exceto pelos clichês de narrativa), coisa que os Wachowskis não fazem desde Matrix Revolutions em 2003. Isso já faz doze anos. E como vivemos em um mundo onde todo diretor revelação é mandado para uma franquia pré-fabricada - Gareth Edwards saiu de Monstros para Godzilla, Colin Trevorrow saiu de Sem Segurança Nenhuma para Jurassic World e por aí vai - temos que prestigiar autores de gênero que continuam, sabe, fazendo coisas novas. Os Wachowskis lançarem algo novo, nem que não seja original, dá mais prazer do que um filme de uma franquia que está aí há décadas.

E tem mais. Vá comprar o ingresso porque algum filme precisa desbancar Sniper Americano nas bilheterias. Porque Redmayne pode ganhar um Oscar. Porque é quase Carnaval e o Channing Tatum faz a viagem de qualquer um valer a pena. Porque se pessoas o bastante forem ver esse filme, talvez os Wachowskis se elevem aos seus lugares de direito como diretores de algum dos spin-offs de Star Wars, como aconteceu com Josh Trank. Porque coisas voando no espaço são maneiras.

Mas, principalmente, vá comprar o ingresso porque os Wachowskis são parte de uma espécie ameaçada de extinção: cineastas de ficção científica original. E no longo e tenebroso inverno antes da máquina Marvel voltar a ligar, faz bem se lembrar de como era a sci-fi - para melhor ou pior. 

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