quarta-feira, 8 de julho de 2015

Até Os Cientistas Precisam de Férias às Vezes - Quarta Científica #19


Na categoria de manchetes estúpidas, "Vida Alienígena Não É Encontrada em Cometa" concorre ao primeiro lugar. Um artigo com esse título foi publicado no jornal The Guardian em 6 de Julho em resposta a outra matéria que alegou a possibilidade de haver vida no cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko.

Só que simplesmente não existem evidências suficientes para sustentar essa teoria. A chance da vida se desenvolver em um pedaço de rocha congelado sem luz do sol ou oxigênio é microscopicamente pequena.

A proposta foi feita no Encontro Nacional de Astronomia em Llandudno, País de Gales, bem como em uma coletiva de imprensa feita antes da conferência. Me pediram para dar opinar sobre a coletiva e eu disse que achava a ideia "altamente improvável". Apesar disso, a história foi recolhida pela mídia e, como era de se esperar, criou um frisson nas mídias sociais.

Óbvio que já tem havido muito interesse nos relatórios sobre o cometa, que é o destino da missão Rosetta da Agência Espacial Européia. Outras descobertas sobre ele foram publicadas em revistas especializadas e várias imagens incríveis da superfície foram colocadas em websites e jornais pelo mundo afora.

Mas em toda essa cobertura, nunca houve um suspiro de uma sombra de um rumor que o cometa, no momento viajando na direção do Sol (e se aproximando da Terra), pode conter vida extraterrestre.

Bases Duvidosas


E qual é a história por trás dessa manchete? Ela vem de uma interpretação das texturas na superfície do 67P, discutindo sua possível produção por micro-organismos. Na verdade, o título da coletiva era "Micro-organismos explicam as marcas na superfície dos cometas?" E na minha opinião, a resposta é um curto e grosso "não".

Os astrobiólogos Max Wailis da Universidade de Cardiff e Chandra Wickramasinghe da Universidade de Buckingham, que escreveram o artigo, propõem que o ambiente de um cometa pode sustentar vida microbiana.

Argumentam eles que alguns micro-organismos terrestres podem sobreviver em temperaturas de até -40ºC (embora a maioria dos estudos a respeito diga que o limite é -20ºC). E já que a temperatura do cometa deve ter aumentado agora que ele está mais próximo do Sol, poderia haver atividade de microorganismos. Além disso, os autores argumentam que a presença de gelo de água e compostos orgânicos na superfície do cometa, bem como rachaduras e fissuras onde as bactérias poderiam se instalar, tudo isso indica que a vida poderia estar presente.

De fato, não é completamente impossível. A ausência de luz e de atmosfera não eliminam a possibilidade de organismos vivos existirem em um cometa. Uma quantidade enorme de fauna domina as profundezas dos oceanos da Terra, assim como bactérias e micro-organismos podem sobreviver a temperaturas baixas e até podem ser viáveis para uso após serem congelados.

O que mais me incomoda sobre esse argumento é que há vários processos não-biológicos que criam compostos orgânicos: moléculas orgânicas, as precursoras da vida, não precisam ser bióticas (ou seja, criadas por organismos vivos). Outra coisa, a fotossíntese não é possível, já que não há luz presente. Que reações químicas capazes de manter um ecossistema estariam acontecendo lá? Eu não garanto nenhuma.

Posto tudo isso de lado e aceito que micróbios poderiam sobreviver no cometa em um certo estado de hibernação, ainda há uma grande pergunta a responder: de onde eles vieram? Esse é o meu maior problema com a versão da panspermia (Teoria que defende que a vida na Terra teria se originado de material orgânico vindo do espaço) proposta pelos autores.

A origem da vida na Terra não é compreendida totalmente, mas nós estamos fazendo um bom progresso no sentido de decifrar os mecanismos que compõem cada estágio do processo. Enfiar esses mecanismos em um ambiente desconhecido e sugerir que a vida na Terra foi semeada por micróbios em cometas não resolve nada. Só coloca o problema ainda mais longe e o torna ainda mais difícil de estudar.

É porque está quente? A gente já está com tanta preguiça assim por causa da onda de calor dos últimos dias? Já que não temos nada melhor para fazer, vamos calcular as chances de encontrar vida alienígena no espaço. O que será que a Curiosity anda fazendo em Marte?

Fonte: IFScience

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