quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Aposto Que A Nintendo Nunca Ensinou Sobre Casamentos Multiétnicos - Quinta Jogando #36

O efeito que os videogames podem ter, durante toda a sua curta história, tem sido constantemente incompreendido pelos que julgam rápido demais. Ao longo de toda a minha infância e até na minha vida adulta, eu tive que lidar com os descrentes que afirmam que "jogos não ensinam nada!" ou que eles são só "entretenimento acéfalo". Só que não é bem assim, como aqueles entre nós que têm videogames como algo mais do que um passatempo sabem muito bem.


Os jogos, sem dúvida nenhuma, podem te ensinar coisas sobre você mesmo. Muitos jogadores descobriram seus talentos de liderança ao comandarem uma grande raid em World of Warcraft. Alguns jogos ensinam história, e eu atesto que, depois de horas jogando Shogun Total War, eu fiquei cada vez mais interessado na Era Sengoku, e até hoje sou capaz de descrever algumas das maiores batalhas do Japão feudal, graças ao excelente jogo de estratégia da Creative Assembly.

Mas o mais importante é que os jogos podem abrir as portas para conversas importantes. Conforme minha filha foi crescendo e ficando mais interessada nos jogos que eu jogo, a ideia de um videogame como o ponto inicial de uma conversa tomou um significado completamente diferente para mim. Jogar com a minha filha se tornou uma parte essencial da nossa relação. Nós rimos e trocamos high-fives quando fazemos algo legal. Ela aprende a não ficar chateada consigo mesma se falharmos, pois sempre podemos tentar de novo.

Mas o mais importante é que nós conversamos.

Quando eu estava começando Fallout 4, eu pedi que ela viesse me ajudar a criar os personagens. Geralmente, esse não é um jogo que eu a deixaria assistir. Toda aquela violência física e verbal não é algo a que eu gostaria que a minha filha de seis anos fosse exposta. Pelo menos ainda não. Entretanto, eu queria deixar a imaginação dela fluir solta enquanto ela criava o personagem que tinha na cabeça. Obviamente, ela quis criar a mulher, então lá fomos nós.


Conforme íamos progredindo, eu percebi que ela estava fazendo a personagem bem parecida com a mãe dela: cabelo cor de mel, olhos verdes amendoados e um grande sorriso. Assim que ela terminou de me dizer como ela queria que a personagem fosse (nós já tínhamos decidido que jogaríamos com ela), eu comecei a mexer no marido. Eu fiz algumas mudanças: aumentei o nariz um pouco, coloquei um bigode estiloso (afinal, é Novembro Azul) e mudei a cor da pele. Começamos a jogar com a personagem dela e tudo estava normal. Conforme ela andava pela casa e babava pelo bebê no berço, eu sabia quando as coisas iam ficar feias após ter jogado várias horas no PC. Eu estava a postos para interromper o jogo dela, mas aí ela falou:

"Papai," disse ela, "eles não podem ser casados. A cor da pele é diferente."

Eu fiquei em choque. Nós sempre a educamos para abraçar diferenças. O ambiente dela sempre foi muito diverso, com familiares e amigos vindos de várias culturas e situações diferentes. Mas, ao que parece, só estar em um ambiente não ajuda quando pessoas de confiança fora do meu controle dizem a ela que casamento inter-racial é errado. Nunca me ocorreu que era necessário termos essa conversa, afinal havia exemplos disso em todo lugar em volta dela, especialmente seus padrinhos. Eu, na minha aparente inocência, presumi que ela entendia que não havia nada errado com eles, e que pensar de outra forma era arcaico. E apesar disso, havia alguém em quem ela confiava que dizia o contrário, e já que nós nunca tínhamos conversado a respeito, a palavra deles era lei.


Nós costumamos pensar nas grandes influências que os jogos podem ter em nossos filhos - eu não estar disposto a expor a minha à devastação nuclear que destruiria a utópica Sanctuary Hills é um ótimo exemplo. Por causa disso, podemos acabar esquecendo das pequenas coisas. O simples fato de eu ter mudado a cor de pele do meu personagem foi o suficiente para iniciar uma conversa que, com toda a certeza, vai influenciar muito a mulher que ela vai ser.

E é aí que costumamos ver as pessoas desvalorizarem os videogames em relação aos outros meios. Claro, filmes, literatura e arte tradicional podem ser assuntos para conversa, mas a interatividade de um jogo te atrai mais do que outros meios. Milha filha se identifica mais com a Princesa do jogo Chariot do que com Anna e Elsa de Frozen (apesar de ela ser muito boa em brincar na neve), só pelo fato de ela ter controle direto sobre o que a personagem em Chariot faz. Quando ela vê na tela sob seu controle algo que vai contra o que ela acha, o impacto é maior do que com um filme ou poema.

"Se eles se amam, tem problema eles serem diferentes?" Eu perguntei.

"Não." Ela concluiu.

"Então quem somos nós para dizer que eles não podem ser casados?"


Eu acredito piamente que não teríamos tido essa conversa por mais um bom tempo caso Fallout 4 não tivesse aberto a porta no chute desse jeito. Esse assunto não teria sido explorado até ela ficar mais velha, mas graças a essa abertura, fomos capazes de discutir o que estavam dizendo para ela lá fora. E no final das contas, ela conseguiu chegar sozinha à conclusão de que não há nada errado com duas pessoas apaixonadas se casarem, seja quais forem as diferenças que o mundo enxergue nelas.

Conforme eu observava ela explorar a casa imaculadamente decorada antes das bombas caírem, sorrisos estampavam nossos rostos. Ela estava adorando interagir com o bebê no berço enquanto eu estava simplesmente feliz por esse jogo ter fortalecido um laço entre nós. Os jogos não são só capazes de nos dar horas de fuga da realidade, como também podem ser os catalisadores para que conversas importantes ocorram, se estivermos dispostos a aproveitar essas oportunidades quando elas aparecerem.

Fonte: Gamesradar

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