Os seres humanos herdam muitos traços genéticos diretamente de seus pais. No entanto, traços culturais - ferramentas, crenças e comportamentos transmitido pelo aprendizado - podem ser passadas adiante não só pelos pais mas também por professores e outras pessoas. Muitos animais exibem comportamentos aprendidos, mas os humanos são especialmente bons em melhorar um conhecimento existente para inovar mais. Essa capacidade, conhecida como cultura cumulativa, pode ser explicada com a frase de Sir Isaac Newton, "Se eu vi mais longe, é porque estava de pé nos ombros de gigantes."
É possível ver evidências da cultura cumulativa no registro arqueológico; ao longo do tempo, há um aumento cada vez maior no número de ferramentas que as pessoas usavam. Mas o registro também revela outro padrão: também há evidências de perdas de cultura em grande escala. Por exemplo, escavações arqueológicas sugerem que as populações aborígenes da Tasmânia perderam várias tecnologias ao longo do tempo, incluindo redes, ferramentas de osso e roupas quentes, mesmo que essas ferramentas ainda pudessem ser úteis.
E também não parece que a acumulação cultural procede ao longo do tempo em um ritmo regular. O registro arqueológico sugere a existência de grandes explosões de inovação após períodos relativamente longos onde pouco mudou. Por exemplo, o registro arqueológico humano foi composto principalmente de ferramentas de pedra por aproximadamente dois milhões de anos. Depois, entre 60.000 e 30.000 anos atrás, os arqueólogos descobriram uma explosão de atividade criativa, como sepulturas, pinturas rupestres e estátuas, e ferramentas gravadas de osso e chifre.
O processo da mudança da frequência e da distribuição de traços culturais ao longo do tempo é chamado de evolução cultural. Mas qual é sua força motriz? Por que o repertório de ferramentas aumentaria em alguns momentos e diminuiria em outros? Essas perguntas têm intrigado os arqueólogos há décadas. Nós propomos um novo modelo que acreditamos esclarecer alguns aspectos de como a evolução cultural ocorre - e, principalmente, ele se baseia na ideia de que nem todas as inovações ocorrem do mesmo jeito.
Modelando O Avanço das Culturas
Já que não é possível (nem ético) manipular experimentalmente grandes grupos de pessoas, os cientistas criam modelos matemáticos para tentar entender como traços culturais evoluem. Um modelo desse topo é um grupo de regras que descrevem mecanismos que podem estar por trás do processo que nos interessa.
Por exemplo, um modelo de evolução cultural pode usar equações para descrever a taxa na qual os indivíduos inventam coisas novas, transmitem conhecimento e aprendem com os outros. Essas equações dependeriam de alguns parâmetros - coisas como o tamanho da população e as taxas de invenção e aprendizado.
Um modelo pode ser explorado analiticamente, calculando quais padrões o grupo de equações prevê, ou ele pode ser explorado usando simulações de computador. Em nossa pesquisa, fizemos os dois.
A maioria dos modelos de evolução cultural estuda a espalhada de tecnologias e comportamentos que já existem em uma população. Em nosso recente artigo para a PNAS, co-escrito por Marcus Feldman, da Universidade de Stanford, nós propusemos um novo modelo de evolução cultural. O que torna o nosso diferente é algo simples: não presumimos que todas as inovações humanas são criadas do mesmo jeito.
Vendo As Previsões do Modelo se Realizarem
Trabalhar com um modelo é como jogar uma versão científica de The Sims. No computador, nós simulamos uma população humana de um certo tamanho. Ditamos as regras para alguns processos de inovação interdependentes, para que eles ocorram em ritmos diferentes. Por exemplo, invenções que podem ser chamadas de "toques de gênio" são raras, enquanto a criação de versões melhores de ferramentas que já existem são mais frequentes.
Nós permitimos que novos "saltos" no conhecimento ocorressem a uma certa taxa por pessoa. Assim que alguém na população tiver feito um desses raros saltos, outras inovações podem ocorrer mais rapidamente. Por exemplo, a invenção de uma rede de pesca pode levar à criação de ferramentas derivadas - como um peso para afundá-la - ou a combinações com outras já existentes, como usar uma vara para jogar a rede.
Esses processos diferentes de inovação - ideias relâmpago e melhorias graduais - ocorrem em ritmos diferentes. As relações entre elas determinam se a acumulação de ferramentas ocorre em um padrão gradativo ou não. Se os saltos de inovação forem bem comuns, o número de ferramentas na população pode demonstrar um crescimento constante e acelerado. Por outro lado, se os saltos são raros, mas as populações rapidamente inventam ferramentas relacionadas e frequentemente combinam tecnologias existentes em ferramentas novas, cada novo salto vai levar a uma explosão rápida de inovações culturais de maneira pontuada.
Há dois outros contribuintes importantes para a evolução cultural observados pelo nosso modelo. O primeiro é a distribuição diferenciada de conhecimento na população. Nós definimos as "regras" do nosso modelo para que o conhecimento pudesse ser concentrado em um subgrupo da população, como os curandeiros. Quando o conhecimento é restrito a um grupo pequeno, há um risco maior de que ele se perca.
Em segundo lugar, nosso modelo considera a influência da mudança no ambiente. Ferramentas podem se perder após uma mudança no ambiente - como um clima se tornando mais quente ou mais frio - ou uma migração para um novo lugar, onde as ferramentas existentes não sejam tão úteis - uma rede de pesca, por exemplo, não teria utilidade em uma savana. É mais provável que uma ferramenta seja perdida se ela não for útil no ambiente atual.
Razões da Vida Real Para As Previsões do Modelo
Os pesquisadores continuam a discutir as razões por trás das súbitas explosões de acumulação cultural no registro arqueológico. O consenso geral é de que esse padrão se deve a eventos externos. Seres humanos criam uma enormidade de novas ideias devido a mudanças no ambiente (um desafio de sobrevivência causado por um período de seca, por exemplo) ou à evolução de novas capacidades cognitivas (cérebros que ficaram maiores e mais poderosos)
Nosso modelo demonstra que esse padrão pontuado de "explosões culturais" pode, na verdade, ser uma característica da própria evolução cultural, exercendo seu papel junto a outros processos evolucionários e ambientais. Contanto que algumas inovações dependam da existência de outras - o que é um aspecto fundamental da cultura humana - esses tipos de explosões de novas tecnologias são o que se espera que aconteça.
Nossa pesquisa joga uma nova luz sobre a evolução cultural, aprofundando o nosso entendimento da evolução humana antiga. Ele também reflete como a inovação pode levar a futuras tecnologias que hoje são inimagináveis.
Fonte: IFLScience
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